A Paternidade de São José
a partir dos Evangelhos
A paternidade de São José e seu casamento com Maria constituem a raiz de todos os privilégios josefinos e a razão de suas prerrogativas, assim como a Maternidade Divina de Maria está para os privilégios marianos. Esta paternidade é nova, única, singular, porém verdadeira, como escreveu Sinibaldi em seu livro “A grandeza de São José”, ou ainda como afirmou o cardeal Billot que é um caso raro de paternidade, algo “sui generis”, pois não existe no vocabulário humano algo que exemplifique esta relação de São José com Jesus.
Na mesma linha de pensamento está São Bernardo ao exemplificar em uma de suas homilias que a dignidade e a santidade de São José são dedutíveis do seu nome de “Pai de Cristo”. Por isso, esse título que lhe atribuímos é o mais sublime e divino dentre todos os títulos e atributos ao Santo Patriarca. Sua paternidade verdadeira é sobrenatural pela sua genealogia, pelo seu matrimônio, pela concepção virginal e pela autoridade que ele exerceu sobre Jesus e Maria. Vejamos esses atributos:
Pela genealogia: O evangelista Mateus procurando provar aos judeus que Jesus era o verdadeiro Messias, esperado e anunciado pelos profetas como filho de Davi, coloca a genealogia direta e natural pela linha de São José. Já o Talmude - código da lei religiosa e civil do judaísmo - ensinava que todo aquele que realizasse um culto a Javé tinha que apresentar ao Sinédrio - Corte suprema de Israel - sua árvore genealógica como título de honra, e a mais alta era a estirpe davídica. A árvore genealógica de Mateus tem a finalidade de demonstrar a transmissão da realeza messiânica de Abraão e Davi até Jesus. Mateus faz isso enumerando os descendentes de Jesus até chagar em José, mas na sequência não usa o verbo “gerou”, pois o substituiu pela frase: "o esposo de Maria da qual nasceu Jesus, chamado Cristo”(1,16), explicitando que se deve desvincular José do ato preciso da geração de Jesus e confirmando a sua geração virginal e sobrenatural.
Por que Mateus nos dá a genealogia de São José, o qual não colaborou fisicamente para a geração de Jesus? Porque entre José e Maria existiu um verdadeiro casamento e Cristo nasceu do esposo José como filho legítimo de mãe legítima. A esse respeito declara Lápide: "José foi mais pai de Cristo do que é qualquer pai adotivo de seu filho adotado; pois Cristo nasceu dentro do matrimônio de ambos; além do mais, a prole que nasce de um legítimo matrimônio é dos cônjuges, portanto, Cristo é filho de José por direito de matrimônio...”.
Pelo matrimônio com Maria: O caráter extrínseco principal de sua dignidade paternal é o casamento com Maria, o qual foi perfeito enquanto vínculo e imperfeito quanto ao uso. Não faltaram escritores, por exemplo, Pelágio, que negaram o verdadeiro matrimônio de José com Maria porque acreditavam que este era incompatível com o voto de virgindade e alguns racionalistas equipararam esse matrimônio como todos os demais e consequentemente negaram a concepção virginal de Jesus. Mas o que dizem os evangelhos? Mateus (1,18-5) “... o que nela foi gerado vem do Espírito Santo... Eis que a Virgem conceberá...”. O anjo notifica a José o mistério da Encarnação. Não devemos nos esquecer que ambos já eram comprometidos em matrimônio, embora não coabitassem; eram noivos e isso não equivalia a uma mera promessa de futuro matrimônio, mas um perfeito contrato matrimonial que constituía um verdadeiro estado jurídico. Nesta fase havia todo o vínculo do matrimônio e tal não podia ser rompido a não ser pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. O filho gerado antes do matrimônio, se os noivos já faziam vida comum, era tido como legítimo. A mulher que perdia o marido nesta fase era tida como viúva e se tivesse relações sexuais com outro homem era tida como adúltera e castigada como tal; além do mais, esta não podia ser despedida sem o divórcio dado pelo noivo. O matrimônio era, portanto, para os judeus uma solenidade exterior, uma formalidade legal.
Mas, por que Deus quis que seu Filho fosse concebido de uma Virgem casada? Para os estudiosos a razão é óbvia; primeiro porque desse modo foi ocultado o mistério da Encarnação. Nesse sentido Santo Ambrósio é categórico ao dizer: ”O Senhor preferiu que alguns chegassem a duvidar de seu nascimento, mas não da pureza de sua mãe; pois Ele conhecia o sensível pudor da Virgem e a facilidade com que se pode perder essa virtude; além disso, deu à Virgem auxílio e consolo por meio de um esposo e assim foi ele testemunho e guarda de sua virgindade”. Santo Tomás acrescenta que Maria sendo virgem e casada, seria honrado nela não apenas a virgindade, mas também o matrimônio contra os hereges que atacariam ambas as coisas.
Por isso, no momento da Encarnação, Maria e José eram apenas noivos, como era o costume judeu e a celebração do casamento se deu depois do anúncio do anjo a José. De fato, Lucas ( 1,27) enfatiza que o anjo foi enviado por Deus a “uma virgem desposada com um homem chamado José...”, e Mateus ( 1, 18) relata : “Maria, sua mãe, comprometida em casamento com José, antes que coabitassem achou-se grávida pelo Espírito Santo...”, excluindo toda a relação conjugal.
Pe. José Antonio Bertolin OSJ