São Tarásio, natural de Constantinopla, foi um dos Patriarcas mais
célebres da Igreja oriental. O pai, nobre patrício e bom cristão, teve
todo empenho em proporcionar-lhe uma boa educação. O filho satisfez
perfeitamente aos desejos e esperanças do progenitor, tanto que, uma vez
conhecido na sociedade, era objeto da admiração de todos, por causa do
seu saber e belo caráter. Abriam-se-lhe ao futuro as perspectivas mais
risonhas e prometedoras. Convidado pelo imperador Constantino V e sua
esposa Irene, ocupou o cargo de cônsul e mais tarde de secretário do
Estado. Os atrativos do mundo, o brilho de posições elevadas não
conseguiram entretanto, ofuscar-lhe a vista. A vida na corte, tão cheia
de seduções e escolhos para a virtude, em nada lhe modificou os
sentimentos de piedade e a sobriedade de seu caráter. A todos e em todas
as emergências, dava o exemplo de cristão reto.
Havia no Oriente uma seita, que combatia o culto das imagens, chamada
a dos iconoclastas. Paulo III, Patriarca de Constantinopla embora
merecedor dos maiores elogios, como Prelado virtuosíssimo e caridoso que
era, teve a fraqueza de não se opor à perniciosa seita, com a energia
que as circunstâncias exigiam, tanto que a opinião de muitos católicos o
acoimava como fautor da mesma. Uma doença grave, que Deus lhe mandou,
abriu-lhe os olhos. Muito arrependido do erro que cometera, renunciou o
cargo e retirou-se para a solidão, a fim de fazer penitência. Tão firme
ficou nesse propósito, que amigos íntimos não o puderam demover do
intento. Uma visita da própria imperatriz Irene, (esposa de Leão IV) e
suas insistências para que voltasse ao cargo, não tiveram melhor
resultado.
Paulo tomou o hábito de monge e propôs São Tarásio para seu sucessor. A indicação não podia ser mais acertada, apesar de São Tarásio se opor com toda a força. Paulo morreu pouco depois e São Tarásio recebeu a sagração patriarcal, na festa de Natal de 784. Uma das condições principais, sob as quais São Tarásio
tinha aceito o cargo de Patriarca, fora a convocação de um Concílio,
que decidisse a questão do culto das imagens. O Concílio realizou-se em
Nicéia, na Bitinia, e o resultado foi à anatematização da heresia dos
iconoclastas.
São Tarásio,
na compreensão nítida da alta missão de Bispo e Patriarca, praticou as
virtudes cristãs, procurando ao mesmo tempo implantá-las na alma do
povo. A todos dava o exemplo da caridade prática, convidando a pobreza
para com ele partilhar as refeições em palácio. Esta praxe não teve a
aprovação de todos, e houve quem o censurasse por isso, querendo
fazer-lhe ver que a caridade assim compreendida e efetuada, não conduzia
a dignidade que representava, como Patriarca. “Minha ambição única,
respondia São Tarásio, é imitar Nosso Senhor Jesus Cristo, que viveu para servir aos outros e não para ser servido”.
Para que o povo tivesse sempre mestres que o instruíssem na religião e o defendessem contra as heresias,São Tarásio
fundou alguns conventos e tudo fez para que nada faltasse ao rebanho,
que a Divina Providência aos seus cuidados confiara.
Tanto zelo, tanta dedicação não podia subsistir, sem que o inferno
contra eles se enfurecesse. Não só iconoclastas, como também maus
católicos, moveram uma campanha atroz contra o Prelado. À campanha
aberta preferiram a encoberta, e muitos meses não se passaram, sem que
Tarásio se visse emaranhado nas malhas de calúnias de toda espécie.
O Bispo opôs à vil campanha as armas da fé em Deus, da paciência e da caridade.
O
imperador, tomado de amores ilícitos por uma dama da corte, acusando a
esposa de tentativa de morte por veneno, requereu do Patriarca o
divórcio, para contrair matrimônio com Teodata, era esse o nome da
adúltera.São Tarásio
opôs-se ao alvitre do monarca, pediu-lhe que desistisse do ímpio
projeto e ameaçou-o com os efeitos da vingança divina. Constantino, cego
de paixão, não tomando em consideração as advertências e conselhos do
Patriarca, exigiu-lhe a aprovação do casamento com Teodata, alegando –
infelizmente com razão – a atitude de Patriarcas anteriores, em
condições idênticas.São Tarásio,
porém, ficou firme e disse: “Mais temo cair em desagrado do Rei dos
reis, que perder as boas graças de um rei mortal”. Constantino, uma vez
no caminho dos desregramentos, adotou o sistema monárquico absoluto,
afastando a mãe da gerência nas coisas de política. Irene soube
vingar-se. Se no princípio disfarçadamente, mais tarde fez guerra aberta
ao filho; moveu contra ele elementos poderosos militares. Constantino
foi preso; por ordem da mãe arrancaram-lhe os olhos, com tanta
crueldade, que morreu em conseqüência disso. Irene subiu novamente ao
trono, mas seu governo pouca duração teve. Vento semeara, tempestade
havia de colher e colheu. Em 802 foi derrubada do poder e desterrada
para Lesbos, onde morreu desgostosa.
Pela morte de Constantino, voltaram para São Tarásio
dias de sossego, que não mais foi perturbado por novas lutas. Tanto
Irene, como seu sucessor Nicéforo, deixaram a Igreja em paz. Vinte e
dois anos pode São Tarásio governar o patriarcado, dedicando-se de corpo e alma aos trabalhos na vinha de Cristo.
Embora já velho e doente, celebrava todos os dias o santo sacrifício da
Santa Missa, preparando-se assim santamente para a morte.
Antes de entregar a alma ao eterno repouso o demônio armou-lhe uma luta
terrível, molestando e martirizando-o com pensamentos de desespero.
Pessoas que o puderam observar de perto, viram-no tremer no corpo todo,
acusando sinais de temor e de angustia. Uma outra vez ouviram exclamar:
“Não fiz tal coisa! É mentira!” – “Sim, isto eu fiz, mas confessei-me
sinceramente e espero de Deus misericórdia”. – Os circunstantes,
observando esta luta entre a alma e o demônio, puseram-se a rezar
fervorosamente. São Tarásio, livre daquele pesadelo terrível,
serenamente entregou a alma a Deus em 806.
Quatorze anos depois da morte de São o
imperador Leão, amigo dos iconoclastas, viu em sonhos o falecido
Patriarca que lhe lançava olhares ameaçadores, dando a um tal Miguel
ordem para que o matassem. Em vão procurou Leão descobrir esse Miguel.
Seis dias depois foi assassinado por Miguel, o Gago, que se apoderou do
trono imperial.