quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Lembrai-vos São José!

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QUAMQUAM PLURIES
Carta Encíclica de Sua Santidade o Papa Leão XIII

Aos Patriarcas, Primazes, Arcebispos, Bispos e outros Ordinários locais que estão em paz e comunhão com a Sé Apostólica, sobre a necessidade de se recorrer ao Patrocínio de São José, junto ao da Virgem Mãe de Deus, nas dificuldades dos tempos atuais.

Ainda que por diversas vezes já tenhamos suplicado que se fizessem em todo o mundo orações especiais e se recomendassem vivamente a Deus os interesses da Igreja, todavia ninguém fique admirado se de novo sentimos a necessidade de inculcar o mesmo dever.

Em tempos difíceis, especialmente quando o poder das trevas parece tentar de tudo em dano da cristandade, a Igreja costuma invocar humildemente a Deus, seu autor e protetor, com novo fervor e maior perseverança, bem como solicitar a mediação dos santos em cujo patrocínio tem mais confiança de encontrar socorro, em primeiro lugar a bem-aventurada Virgem Mãe de Deus, bem sabendo que os frutos desta piedosa oração e desta esperança cedo ou tarde aparecerão.

Agora bem notais, Veneráveis Irmãos, que os tempos atuais não são menos difíceis do que aquele que a Igreja teve que enfrentar no passado. Vemos, de fato, vir diminuída em muitos a fé, que é o princípio de todas as virtudes cristãs, esfriar-se a caridade e as novas gerações degradar-se nas idéias e na conduta. Vemos a luta que de toda parte se faz à Igreja de Cristo com violenta perfídia; a guerra atroz contra o papado e as tentativas sempre mais declaradas de se derrubar os próprios fundamentos da religião. Até que ponto tenham chegado e quanto ainda estejam tramando os inimigos, é tão claro e evidente que se torna inútil gastar palavras.

Em uma situação tão difícil e angustiante, na qual os males superam em muito os remédios humanos, não nos resta outra coisa senão recorrer à potência divina. Por esta razão, julgamos oportuno estimular o povo cristão a pedir o socorro de Deus onipotente com renovado fervor e inabalável confiança.

De todo o coração vos pedimos que São José seja celebrado com a maior devoção, piedade e participação possível. Sabemos poder encontrar na materna bondade da Virgem um pronto refúgio em todos os nossos males, e estamos certos de que não serão vãs as nossas esperanças junto a ela. Se no passado nos foi propícia em toda necessidade, por que não haveria de renovar os exemplos do seu poder e da sua graça também no presente, se soubermos invocá-la juntos, com oração humilde e perseverante? Nós, antes, estamos certos de que tanto mais nos assistirá, quanto mais longamente quer ser por nós invocada. Mas esta é uma outra iniciativa que Nós propomos e à qual , Veneráveis Irmãos, prestareis, como sempre, a vossa diligente colaboração.

Para fazer com que Deus seja mais favorável às nossas orações, e para que - entre tantos intercessores que podem ser invocados - derrame mais pronta e copiosamente auxílio à sua Igreja, cremos muito útil que o povo cristão habitue-se a rogar com devoção e confiança, juntamente com a Virgem Mãe de Deus, também o seu castíssimo esposo São José. E temos bons motivos para crer que isto será particularmente agradável à Virgem Santa.

Sobre este tema que pela primeira vez nos propomos a tratar publicamente, sabemos que a devoção popular é não só propensa por natureza, mas também já está bastante avançada. E, de fato, vimos um grande progresso no culto a São José, anteriormente promovido pelo zelo dos Sumos Pontífices, depois estendido a todo o mundo, especialmente quando Pio IX, Nosso Predecessor de feliz memória, a pedido de muitíssimos bispos, declarou o Santo Patriarca, Patrono da Igreja Universal. Todavia, por ser muito importante que o seu culto penetre profundamente nas instituições católicas e nos costumes, queremos que o povo cristão receba da Nossa própria voz e autoridade todo o incentivo possível.

As razões pelas quais São José deve ser tido como Patrono da Igreja - e a Igreja por sua vez espera muitíssimo da Sua especial proteção - residem sobretudo no fato que ele é esposo de Maria e pai putativo de Jesus Cristo. Daqui derivam toda a sua grandeza, graça, santidade e glória.

Sabemos que a dignidade da Mãe de Deus é altíssima e que não pode haver uma maior. Mas dado que entre a beatíssima Mãe de Deus e São José existe um verdadeiro vínculo matrimonial, é também certo que São José, mais que qualquer outro, se aproximou daquela altíssima dignidade que faz da Mãe de Deus a criatura mais excelsa. De fato, o matrimônio constitui por si mesmo a forma mais nobre de sociedade e de amizade, e traz consigo a comunhão dos bens. Portanto, se Deus deu José como esposo a Maria, deu-o não só como companheiro de sua vida, testemunha de sua virgindade e tutor da sua pureza, mas também como participante - por força do vínculo conjugal - da excelsa dignidade da qual ela foi adornada. Além disso, ele eleva-se entre todos em dignidade também porque, por vontade de Deus, foi guarda e, na opinião de todos, pai do Filho de Deus. Em conseqüência, o Verbo de Deus foi humildemente submisso a José, obedeceu-lhe e prestou-lhe a honra e o respeito que o filho deve ao seu pai.

Ora, desta dupla dignidade derivaram espontaneamente os deveres que a natureza impõe aos pais de família; assim, pois, São José foi guarda legítimo e natural da Santa Família, e ao mesmo tempo seu chefe e defensor, exercendo estes ofícios até o fim de sua vida.

Foi ele, de fato, que guardou com sumo amor e contínua vigilância a sua esposa e o Filho divino; foi ele que proveu o seu sustento com o trabalho; ele que os afastou do perigo a que os expunha o ódio de um rei, levando-o a salvo para fora da pátria, e nos desconfortos das viagens e nas dificuldades do exílio foi de Jesus e Maria companheiro inseparável, socorro e conforto.

Pois bem: a Sagrada Família, que José governou com autoridade de pai, era o berço da Igreja nascente. A Virgem Santíssima, de fato, enquanto Mãe de Jesus, é também mãe de todos os cristãos, por Ela gerados em meio às dores do Redentor no Calvário. E Jesus é, de alguma maneira, como o primogênito dos cristãos, que por adoção e pela redenção lhe são irmãos.

Disto deriva que São José considera como confiada a Ele próprio a multidão dos cristãos que formam a Igreja, ou seja, a inumerável família dispersa pelo mundo, sobre a qual Ele, como esposo de Maria e pai putativo de Jesus, tem uma autoridade semelhante a de um pai. É, portanto, justo e digno de São José, que assim como ele guardou no seu tempo a família de Nazaré, também agora guarde e defenda com seu patrocínio a Igreja de Deus.

Tudo isto, Veneráveis Irmãos, encontra apoio - como bem o sabeis - no ensinamento de não poucos Padres da Igreja. De acordo nisto com a Sagrada Liturgia, eles entreviram no antigo José, filho do patriarca Jacó, a pessoa e a vocação do nosso [José]; e no esplendor que daquele emanava, viram simbolizada a grandeza e a glória do Guarda da Sagrada Família. De fato, além de terem ambos recebido - não sem significado - o mesmo nome, existe entre eles muitas outras e claras semelhanças, a Vós bem conhecidas.

Em primeiro lugar, o antigo José ganhou para si a benevolência de seu senhor de um modo todo singular; e depois conseguiu, graças ao seu zelo, que chovesse do céu toda a prosperidade e bênçãos sobre o seu patrão, de quem dirigiu a casa. E mais: por vontade do rei governou com plenos poderes todo o reino, e quando a carestia se tornou calamidade pública, foi ele quem alimentou os egípcios e os povos vizinhos com exemplar sagacidade, a ponto de ser merecidamente chamado pelo faraó de “salvador do mundo”.

Assim, no antigo patriarca é fácil de se ver a figura do nosso [José]. Como o antigo José foi a bênção para a casa de seu patrão e para todo o reino, assim o nosso José foi predestinado a guardar a cristandade e deve ser tido como defensor da Igreja, que efetivamente é a Casa do Senhor e o reino de Deus na terra.

Todos os cristãos, por isso, de quaisquer condições e estado, têm bons motivos para se confiarem e se abandonarem à amorosa proteção de São José.

Nele, os pais de família encontram o mais alto exemplo de paterna vigilância e providência; os cônjuges, o exemplo mais perfeito de amor, concórdia e fidelidade conjugal; os consagrados a Deus, o modelo e protetor da castidade virginal.
Volvendo o olhar à imagem de José, aprendam os nobres a conservar a sua dignidade também na desventura; os ricos descubram quais são os bens que na verdade é necessário buscar e guardar zelosamente. E enfim, os pobres, os operários e todos aqueles que pouco tiveram da sorte, têm um motivo a mais - e todo especial - de recorrer a José e de tomá-lo como exemplo: Ele, embora sendo de descendência régia, desposado com a mais excelsa entre as mulheres, e ter sido considerado como o pai do Filho de Deus, passou todavia sua vida no trabalho, provendo o necessário para si e para os seus, com a fadiga e a habilidade de suas mãos.

Entretanto, é bom refletir que não é verdade que a condição dos pobres seja degradante. O trabalho do operário, longe de ser desonroso, torna-se fonte de nobreza quando associado à virtude. José, contente do seu trabalho e do pouco que possuía, viveu com coragem e nobreza as angústias da vida, seguindo nisto o exemplo de Jesus, que embora sendo Senhor de tudo, fez-se servo de todos e não desdenhou abraçar voluntariamente a pobreza.

Estas considerações devem elevar o ânimo de quem é pobre e ganha o pão com seu trabalho, e fazê-lo raciocinar retamente. De fato, se é verdade que a justiça consente em poder libertar-se da pobreza e alcançar uma posição melhor, também é verdade que a ninguém é permitido, nem à razão, nem à justiça, subverter a ordem estabelecida por Deus. Antes, recorrer nestes casos à violência e tentar o caminho da sublevação e dos tumultos é uma escolha desesperada, que na maioria das vezes agrava os próprios males que se queria aliviar. Querendo, portanto, agir com prudência, os proletários não confiem tanto nas promessas dos violentos, mas antes no exemplo e no patrocínio de São José, e na caridade materna da Igreja, que a cada dia mais se preocupa pela sua situação.

Portanto, Veneráveis Irmãos, enquanto Nós esperamos muito da vossa autoridade e do vosso zelo de Pastores, e estamos certos de que as pessoas boas e piedosas farão ainda mais do que estamos solicitando, decretamos que por todo o mês de outubro se acrescente à recitação do Rosário - por Nós já prescrita em outra ocasião - a oração a São José que recebeis junto com esta Carta Encíclica, e que isto se repita todos os anos, perpetuamente.

É também útil e louvável que se consagre, como já se fez em muitos lugares, o mês de março ao Santo Patriarca, com exercícios diários de piedade em sua honra. Onde isto não for possível, faça-se ao menos antes da sua festa, no lugar principal, um tríduo preparatório de orações.

Recomendamos, além disso, aos fiéis daquelas nações nas quais o dia 19 de março, consagrado a São José, não esteja incluído entre as festas de preceito, que não deixem por quanto possível, de santificá-lo ao menos em particular, em honra do celeste Patrono, como um dia festivo.

Entretanto, Veneráveis Irmãos, como penhor de graças do céu e na Nossa benevolência, de todo o coração dispensamos no Senhor a Bênção Apostólica a Vós, ao Clero e aos vossos fiéis.

Dado em Roma, junto de São Pedro, no dia 15 de agosto de 1889, 
décimo segundo ano do Nosso Pontificado.